31/01/2004

Ainda a morte de Fehér

Quando li a opinião de José Pacheco Pereira, no Abrupto, sobre as notícias e a comoção geral sobre a morte de Fehér, fiquei chocado. Achei aquele comentário de uma falta de sensibilidade tremenda. Pensei em comentar isso mesmo. No entanto, felizmente que não o fiz. É que José Pacheco Pereira ganhou razão com o passar do tempo.
Fiquei tão chocado com a morte do jogador como qualquer outra pessoa, ainda mais tendo visto a mesma em directo na televisão, ainda mais sendo benfiquista, ainda mais sendo jovem e tendo amigos praticantes de desporto. Mas acredito que a morte do húngaro não tem mais significado do que qualquer outra. Não é mais significativa do que a morte de duas adolescentes no Cadaval na semana passada, nem do que a morte das dezenas de vítimas de acidentes nas estradas. Nem dos milhões de refugiados e inocentes de guerra.
O que dizer das centenas de páginas diárias, ainda uma semana depois do acontecimento, nos jornais (serão pagas pela Vodafone e pelo Banco Espírito Santo, que percebem agora que investir nas camisolas do Benfica é o mesmo que estar em todos os jornais do mundo?), ou do adepto que, no velório de Fehér, se levantou e gritou "Onde está Deus?". Isto parece razoável? Há que chorar a morte e mostrar os sentimentos sim. Mas o exagero é tão condenável quanto a omissão. Porque aí, o que é um sentimento belo e nobre passa a ser mera pornografia de sentimentos e pormenores desnecessários.

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A beleza da vida

Vejo na TVI a alegria dos desalojados da Chamusca após conhecerem a sua nova casa, oferecidas para compensar a perca de todos os seus bens nos incêndios do verão passado. Vejo a alegria de uma senhora de sessenta e tal anos, que nunca tinha tido antes uma casa de banho e que, humildemente, afirma que aquela casa é boa de mais para ela. Vejo a alegreia de um senhor que, pela primeira vez, tem uma casa onde não chove.
É incrível que até mesmo as grandes desgraças trazem coisas boas. O mundo é mesmo inacreditável. Mas é por isso que, mesmo nos momentos mais tristes, a vida é de uma beleza incomensurável.

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26/01/2004

Que era mais novo do que eu

Tentei não escrever sobre o assunto até poder pensar nele sem demasiada emotividade. No entanto, é impossível consegui-lo. A morte de Miklos Fehér chocou o mundo inteiro. Porque tinha 24 anos. Porque era aparentemente saudável. Porque era humilde e trabalhador. Porque foi vista em directo na televisão. Ao que parece, os serviços médicos fizeram tudo o que podiam ter feito. Sabemos que quando chega a hora da morte, não há nada a fazer.
No entanto, este trágico acontecimento, pode, como sempre acontece no nosso País, ironicamente, ajudar em muitas áreas. Durante o Euro 2004, as equipas médicas vão ser irrepreensíveis. Provavelmente, os testes médicos feitos aos atletas no desporto português passarão a ser mais exigentes, evitando-se outros casos semelhantes. Toda a população fica mais ciente e cautelosa quanto a problemas do coração. Provavelmente, muitos aprenderão agora quais os procedimentos em caso de um ataque semelhante, o que poderá salvar muitas vidas no futuro.
Quanto ao Benfica, clube onde jogava, servirá certamente para aumentar a união e a vontade dos jogadores. Quem sabe se este acontecimento horrendo não acabará por ajudar o clube a recuperar a mística perdida e o apoio real dos seus adeptos, a uma equipa à qual tudo acontece? E quem sabe se, a ver pelos exemplos notáveis do Sporting e do FC Porto, dos sócios dos vários clubes, até das claques, ao apoiarem e chorarem a morte do atleta em união, não poderá ajudar a pacificar o desporto português e torná-lo a ser um melhor exemplo para todos?
Enfim, como sempre, Portugal aprende com as tragédias. Faz parte da nossa maneira de ser. E o pior é que, desta vez, nem tivemos a culpa.
Mas, o problema é que se perdeu uma vida. Nem falo do futebolista. Falo do homem. Que tinha só vinte e quatro anos e era aparentemente saudável.
Que era mais novo do que eu.

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20/01/2004

Delírios 1

Os teus olhos são eclipse solar. Tudo o resto é escuro quando eles se abrem.

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Os subsídios que temos

Excelente o post de José Pacheco Pereira, no Abrupto, com o título "NOTÍCIAS DA SUBSÍDIO - DEPENDÊNCIA E NÃO SÓ".
Para ler e perceber como funciona o País.

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18/01/2004

Um cantor na Turquia

Na edição da Operação Triunfo que se realizou logo a seguir à última edição da Operação Triunfo (será que ainda vão haver mais a seguir?), Catarina Furtado pediu aos espectadores para votarem para que se saiba qual é o cantor que queremos ver na Turquia.
Antes de votar, tenho duas dúvidas que me irão condicionar na escolha: o cantor ficará na Turquia para sempre ou depois volta? E não se pode votar em cantores que não estejam na Operação Triunfo?

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O sacrifício de Isac

Ao observar algumas imagens de quadros de Caravaggio, relembrei-me de um dos episódios bíblicos que sempre me incomodou, que é o do sacrifício de Isac. Porque Deus lhe ordenou, Abraão preparava-se para assassinar o próprio filho, não fosse o aparecimento de um anjo enviado pelo Senhor, orgulhoso da fidelidade do seu profeta, para o impedir de prosseguir a chacina.
Em algum caso, qualquer que seja, a ordem para que um pai mate um filho pode ser uma ordem divina? Percebo o significado do episódio. Abraão tinha tanta fé no Senhor que sabia que tudo se resolveria a bem, como veio a acontecer. Mas, mesmo assim, só o facto de um pai admitir tentar matar o seu filho não é pecado maior do que desobedecer a Deus? Não é um atentado à vida um pecado maior do que qualquer outra coisa?

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16/01/2004

Michael Jackson

Vejo a entrevista de Michael Jackson ao "60 Minutos" e fico agoniado. O rosto desfigurado dele, a situação, tudo me enoja. Por saber que há pessoas que são capazes de molestar crianças, mas também por saber que seria ideal que as coisas fossem como ele diz. Porque o que diz está certo, independentemente de ser verdade. Porque, num mundo ideal, não haveria qualquer mal em partilhar uma cama com uma criança. Porque as crianças são de facto o rosto de Deus. Porque, se não houvesse maldade nem frustrações, tudo seria possível de fazer sem que houvesse qualquer pecado ou problema.
Porque gostaria muito de que fosse tudo falso e que Michael Jackson, apesar da sua loucura, apesar do seu desfiguramento, apesar da sua irreverência, não fosse pedófilo. Porque gostaria que ele fosse mesmo apenas um louco que acredita que um homem e uma criança podem partilhar um leito sem que haja qualquer falta de respeito ou violação de qualquer espécie.

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A lei do aborto

Concordo que o aborto, em determinadas circunstâncias e até um determinado prazo, seja despenalizado. Porque acredito que cada um tem o direito de fazer as suas próprias escolhas. Porque acredito na profunda liberdade de cada um, mesmo que seja para errar, se for o caso. Mas, apesar disso, continuo sem perceber se vale a pena voltar a fazer uma pergunta cuja resposta já foi dada. E, apesar de acreditar na liberdade, confesso que tenho medo de que, numa sociedade tão à deriva como a portuguesa, tal acto de último recurso passe a ser visto como um método contraceptivo e seja praticado com mais frequência do que a desejada.
E continuo a acreditar também que, apesar de querer que cada um tenha a liberdade de escolher o seu caminho, um aborto é um atentado à vida, seja em que circunstância for. Eu, pelo meu lado, nunca o apoiaria. Mas isso sou eu. Cabe a cada um decidir em consciência a sua opção e, para isso, é necessário dar a cada um a liberdade de poder decidir.
No entanto, ressaltam algumas dúvidas. Quando, há poucos anos, houve o referendo, a população portuguesa respondeu e escolheu um caminho. Será que não se deve respeitar essa decisão? Que argumento tem a esquerda para voltar a colocar o assunto na berlinda, se ele foi decidido pelas mesmas pessoas que irão voltar a pronunciar-se? Será que é legítimo repetir a pergunta? E se a resposta for a mesma? Exigir-se-á outro referendo a seguir, até que o resultado seja, finalmente, o pretendido?

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12/01/2004

Alentejo

Depois de um fim-de-semana passado em Selmes, no interior do Alentejo, para tentar acabar um projecto que tinha em mãos (misson completed), regresso à cidade. Realmente, faz falta passar mais dias em locais tão calmos e acolhedores como aquele.
No entanto, tenho uma reclamação a fazer: prefiro as ambulâncias e os automóveis a fazer barulho a partir das nove da manhã, do que os galos a cantar a partir das seis.
De resto, viva o interior.

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06/01/2004

Tempo de porcos gordos

No Alentejo, um criador de animais está a braços com um caso nunca visto na zona. Um porco atingiu os dois metros e meio de comprimento e os quatrocentos quilogramas de peso (!). Ninguém percebe como é que o animal cresceu tanto e a diferença entre ele e os outros lamacentos colegas é notória, à vista e pela quantidade de comida que ingere.
A matança do porco ainda não está marcada, mas a ansiedade já é grande. No entanto, pelo meio, fica um bom prenúncio. É que é comum dizer-se no Alentejo que porcos gordos no início do ano são sinal de um ano de fartura. Então, se calhar, o problema dos portugueses tem sido meramente de linguagem. Em vez de dizermos constantemente que estamos num período de vacas magras, proponho que mudemos a frase para “estamos num período de porcos gordos”. E, se pensarmos bem na coisa, na corrupção e negociatas, nas mentiras e escândalos existentes no nosso País, até é capaz de ser uma frase mais feliz e verdadeira do que parece.

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05/01/2004

Chuva de cometas

Uma chuva de cometas invadiu os céus da Peninsula Ibérica na noite de ontem. Há pouco mais de dois mil anos, uma estrela guiou, também por estes dias, os três Reis Magos para a gruta onde Jesus nascera. Os esotéricos sempre falaram da importância da Peninsula Ibérica, e concretamente de Portugal, no futuro da humanidade. Os esotéricos dizem também que em breve aparecerá um novo líder espiritual, um novo Messias.
A Lusitânia (Terra de Luz) sempre foi palco de grandes profecias. Portugal (Portus Cale, Porto do Grall) também.
Tem piada. Tem tudo muita piada. Ou será mais do que mera piada?

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04/01/2004

A vergonha do futebol

Confesso que, às vezes, tenho pena de que o futebol motive tantas paixões. Confesso que, às vezes, me apetece nunca mais ver nenhum jogo, esquecer de uma vez por todas que existem o Benfica e o Sporting, o Eusébio e o Figo, os golos e os aplausos. Quando? Quando um jogo que tem tudo para ser um grande espectáculo de futebol é estragado pelos elementos menos importantes do desporto.
Mais do que um clássico, o Benfica - Sporting foi um reeditar das velhas vergonhas do futebol português. Tudo começou torto, antes do jogo começar. Como sempre. Porque o futebol português é isso, é uma questão de bocas e acusações, de pressões e mentiras. E, ainda por cima, na maior parte dos casos, de mau futebol. Como foi o caso deste derby. Mau futebol, pelo intermédio de jogadores valorizados em excesso e, em muitos dos casos, excessivamente protegidos pela opinião pública.
O estádio estava cheio. E é um estádio lindíssimo, moderno, talvez o mais bonito da Europa (e digo-o com o peito cheio de quem é simpatizante do Benfica, apesar de tentar ser imparcial nas análises). Sessenta e cinco mil gargantas gritavam por ambas as equipas. Sessenta e cinco mil pessoas que, por se deslocarem ao local, por gastarem o dinheiro do bilhete, por amarem o seu clube, independentemente de qual for, mereciam melhor. Mereciam mais verdade no jogo, menos casos, mais profissionalismo e, principalmente, mais justiça e imparcialidade.
Mas não. Como já escrevi, o jogo começou torto ainda antes do seu início. É que a imprensa fez questão de, no dia antes do encontro, fazer notícia do facto do árbitro Paulo Proença ser sócio do Benfica, como se cada um não tivesse direito a ter a sua simpatia e como se isso colocasse em causa a sua imparcialidade. Aliás, parece-me que muitas pessoas nunca perceberam isto: aqueles que se assumem, raramente têm intenção de errar. Seria pouco inteligente ter a sua situação regularizada como sócio de um clube e beneficiá-lo a seguir. Mas os portugueses não estão habituados à honestidade nestes assuntos e, então, resolveram ver no assumir da verdade um perigo ao desporto.
O árbitro prejudicou gravemente o Benfica. Mas atenção: o Sporting jogou melhor. Erros à parte, o Sporting mereceu a vitória. Não porque tenha jogado bem, mas porque os jogadores do Benfica não souberam estar à altura. Porque Simão foi uma sombra de si mesmo, porque Tiago se esqueceu de jogar futebol, porque Sokota falhou um golo fácil. No entanto, o Sporting só mereceria uma vitória neste encontro, se o árbitro não tivesse beneficiado a equipa de forma tão clara, por medo de ser acusado do contrário.
São as pressões do futebol português. É a vitória da falta de desportivismo e da mentira. Mas foi, também, uma grande vitória para uma pessoa: José António Camacho. Consegue manter-se um senhor, mesmo quando tem razões para se zangar e gritar. Porque viu e sentiu os erros do árbitro mais do que ninguém, mas, mesmo assim, prefere falar da sua equipa e recusa-se a falar da arbitragem. Porque sabe que só assim poderá contribuir para o crescimento do nosso futebol. Mais uma lição deste grande homem. Só tenho pena que tenha que vir de um estrangeiro.
Mas, de qualquer maneira, foi esse exemplo que me apaziguou. Foi esse exemplo que me fez acreditar que, apesar de toda a porcaria que envolve o futebol português, de todas as más arbitragens, das pressões, das trafulhices, do mau futebol, apesar de tudo isso, o futebol ainda pode ser um desporto.

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